Compreender, dialogar com a base e seguir na luta

Avaliação da conjuntura nacional feita pelo presidente da CUT/RS, Claudir Nespolo, durante a última reunião do ano do Conselho Geral de Representante do SPMG/Sindicato, no último dia 03 de dezembro, apresentou diversos pontos para compreensão e reorganização do movimento sindical. “Todos os direitos conquistados desde a era Getúlio Vargas estão em cheque nesse momento. Os governos Lula e Dilma estavam trancando a pauta das reformas, que já estavam acontecendo em diversos países. 113 países fizeram reformas trabalhistas ou previdenciárias nos últimos 12 anos. Todas, abrindo as portas para a terceirização e acabando com a jornada fixa e o salário fixo”, argumentou o dirigente.

 

“O capital brasileiro olhava para o que estava acontecendo em outros países e tinham uma ansiedade em criar um ambiente igual no Brasil. Esse foi o golpe.”

 

 

PRÉ-SAL
Nespolo destacou outro fator para que os interesses econômicos favorecessem a ascensão da extrema direita no país. “A descoberta do pré-sal, em 2005, despertou o interesse do mercado. Primeiro, tentaram desbancar a descoberta do pré-sal, e, depois, quando viram que a viabilidade de exploração do petróleo em camadas profundas era real, o país atraiu a atenção mundial. Lula fez uma mudança que incomodou muito o mercado, passando a modalidade de exploração do petróleo em terras brasileiras de concessão para partilha. Ficaram mais incomodados ainda com a exigência de que a produção dos equipamentos e máquinas fosse nacional.” Em sua avaliação, as forças políticas vinculadas ao mercado internacional não reagiram tão ferozmente naquele período porque acreditavam que iriam derrubar o governo dos trabalhadores na eleição de 2010 e que voltariam a ter hegemonia para mudar e colocar em prática suas políticas. “A eleição da Dilma fez com que percebessem que esse modelo não sairia mais. E, a partir daí, começaram a se organizar com ataques sistemáticos, criando as condições para o golpe de 2016, que já veio com a proposta do PMDB (MDB) ‘A ponte para o futuro’.”

AS REFORMAS
Com o impeachment da presidenta Dilma foi instalada a pauta das reformas. A primeira aprovada foi a PEC 240, que se transformou na Emenda Constitucional (EC) nº 95, sancionada em dezembro de 2016. As despesas primárias do orçamento público foram congeladas por 20 anos, limitadas à variação inflacionária. A medida está em vigor há dois anos e já ocorre prejuízo nas políticas públicas ofertadas à população. “O segundo ponto era a reforma da previdência social, mas como é mais complexo, ganhamos o debate na sociedade, fizemos a maior greve geral no dia 28 de dezembro de 2017. Empurraram a esta pauta para frente e passaram para a votação da reforma trabalhista. Nosso maior questionamento é: o déficit da previdência acontece antes da DRU (Desvinculação de Receitas da União) ou depois? É antes da sonegação ou depois da sonegação? O que querem de fato é que a previdência administrada pelos fundos de investimento privados, os bancos”, explica Nespolo.
“Depois puxaram a reforma do ensino médio, a terceirização, a reforma trabalhista, e levaram a cabo a alteração no pré-sal. Desmontaram a indústria naval. O que foi uma tragédia, em especial para as cidades de Pelotas e Rio Grande, aqui no Rio Grande do Sul. Perdemos empregos e a circulação da nossa riqueza dentro do país. Estamos com um punhado de formas de contratação, com período maior de trabalho e salário menor. Só não está mais acelerado porque eles ainda têm medo, não há segurança jurídica nas alterações.”

SERVIÇO PÚBLICO
O presidente da CUT/RS lembrou que as reformas realizadas ao redor do mundo, motivadas pelos interesses do mercado neoliberal, assim como no Brasil, retiram direitos conquistados também no serviço público, pautadas pelo interesse na apropriação dos orçamentos públicos. “No Congresso, há um número enorme de leis represadas, todas direcionadas ao desmonte do serviço público. No caso da previdência, em especial, não querem o Estado como gestor da previdência social, para que estes recursos sejam administrados por fundos de pensão.”

LUTA DE CLASSES
“É uma luta de classes”, enfatiza o dirigente. “Nossos pais nos diziam: estudem, para terem melhor condições. Agora, não podemos dizer isso aos nossos filhos. Será uma geração que não terá as mesmas garantias de trabalho que nós tivemos.” Nespolo questionou a organização das estruturas de poder no país. “Quem é o judiciário brasileiro, quem são os delegados? Ao longo do tempo foram sendo assegurados para a elite diversos privilégios. Nas carreiras da segurança pública ou do magistrado, só quem consegue ascender são filhos de uma elite. Os critérios de seleção levam a isso. Quem tem na família um juiz ou desembargador? Isso nos leva ao julgamento do Lula e a comparação com a situação do Aécio. Um, condenado e preso sem provas, o outro, com todas as provas, está solto. Mas isso acontece porque é preciso conter o Lula.”

ELEIÇÃO
De acordo com Nespolo, o poder econômico não queria ganhar com o Bolsonaro. “Apostavam em outros nomes da direita. Mas teve um fenômeno no meio do caminho, a facada, que o transformou em vítima e isso, no senso comum da população, junto com as fake news, disparadas de forma organizada para milhões de pessoas, levaram a sua eleição. Sobrou o Bolsonaro para vencer no primeiro turno e garantir a pauta.”

“Foi uma eleição fraudada e manipulada. Prenderam o Lula sem provas para retirá-lo das eleições.”

FAKE NEWS
“O debate chegou às camadas mais populares. Criaram um aparato de informações falsas. Na educação, criaram o imaginário da distribuição da mamadeira com pênis e, em conjunto, o debate de que não se pode falar em sexo na escola, só os pais podem, em casa. Assim também com a adulteração de uma imagem onde a Manuela cospe na imagem de Jesus Cristo. Vencer essa adulteração da realidade, estrategicamente forjada para ganhar adesão massiva de segmentos da sociedade será um grande desafio. O panfleto e o noticiário não terão força, enquanto que as notícias falsas continuarão a chegar. As pessoas estão se informando e dando credibilidade ao que chega pelo Whatsapp e Facebook.”

REAÇÃO
“Vamos seguir com a corda esticada, lutando, para resistir ao aprofundamento da concentração de renda. O meu papel como dirigente sindical é trazer clareza sobre este momento e ver com os trabalhadores de que forma vamos fazer o enfrentamento. Vai exigir muito do movimento sindical, das entidades e dos representantes, para manter uma postura de esclarecimento e de comunicação com as pessoas, direto na base. Não vai adiantar o ‘eu avisei’. No momento estão avaliando de forma positiva as tiradinhas do Bolsonaro. Precisamos continuar defendendo a pauta e trazer de volta quem embarcou nesse processo.”
Nespolo afirmou que as centrais e a CUT estão agindo para que os sindicatos se fortaleçam e aprimorem o trabalho de base, com informação boa e inteligente. “Precisamos ficar atentos para não cair nessa cortina de fumaça das fake news em cima de pautas morais. O que interessa agora é o que o Guedes está falando.”

CICLOS
“Tudo é ciclo, já foi muito ruim lá atrás, depois tivemos pleno emprego e perspectivas de melhora. Agora ficou ruim. Mas vejamos Portugal e Espanha. Os governos de lá, que há 15 anos assumiram o neoliberalismo, agora estão recuperando direitos.”

POSICIONAMENTO CONSCIENTE
“Somos uma base classista. Não somos os partidos, não fazemos lei, então isso tem que estar na nossa reflexão e por isso o nosso posicionamento deve ser consciente. Não sejamos ingênuos na defesa do nosso projeto. Em 2020, teremos eleição. Se continuar nessa lógica, teremos vereadores fake news com a caneta na mão para tomar decisões. O papel do sindicato é fazer a reflexão com a sua base e continuar a luta.”

Por Silvia Fernandes – jornalista Mtb 11137